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Um mundo

domingo, 11 de maio de 2014

Mãe- Raquel de Queirós

 
“Se um pedaço do meu corpo toma vida e cria olhos e face e membros e coração e entranhas e até mesmo uma alma imortal, formou-se um ser
independente, mas meu corpo ainda é.
Minha carne, meus ossos, meu sangue e a centelha da minha alma. Nisso está o mistério da união impossível de romper. É o meu filho.
Se lhe machucam a alma, dos meus olhos é que correm as lágrimas que o meu filho se envergonha de chorar.
Ele já foi pequenino — lembram-se? Pequenino como uma semente, tão pequeno que ninguém o encontraria dentro do meu corpo — e dentro de
mim cresceu, todo ele!
Esse riso dele, fui eu que lhe dei. Esses olhos, esses cabelos, fui eu que os fiz assim, no lento trabalho do meu sangue, durante quase um ano, a
roubar minha substância, fazendo o que era minha vida virar-se em sua vida.
E quando a semente palpitante não cabia mais no meu corpo, tive de o trazer à luz do dia.
Mas era frágil como um botão de rosa, e o meu trabalho de amor continuou, anos e anos. Vivendo do meu peito. Dormindo nos meus braços,
andando pela minha mão. Dei-lhe meus dias e noites, meu trabalho, minhas agonias — quantas! — e minhas esperanças.
Hoje está um homem, pronto para a sua tarefa de homem. Tão grande, tão belo. Meu filho.
Direis que de jovem que eu era me fiz velha, pelo amor de meu filho. Mas que importa! E aliás não é verdade: olha, vêde como sou grande, bela,
moça, na figura do meu filho.”